Quando os cinco caras do AC/DC chegaram à Inglaterra em abril de 1976, eles ficaram surpresos quando souberam que John Peel (famoso radialista inglês e crítico de música) estava rotulando a banda de “punks australianos”. Essa tratativa não deixou a banda nenhum pouco confortável.

Angus Young: “Estamos já há um bom tempo tocando juntos e isso nos traz certa confiança nas apresentações. Quando chegamos aqui [Inglaterra] aquela coisa do pop estava reinando. Aí então quando o punk chegou, eu tive a impressão de que era apenas o tipo ‘caras pops encrenqueiros’; um novo estilo de pop.”

Mas esse cinismo do AC/DC com o estilo punk não impediu os amantes do meio de irem aos clubes de Londres – Marquee, Red Cow e outros pelo país – assistir apresentações da banda, que naquele começo tinha reputação de ser bastante energética e tocar com um som extremamente alto e poderoso.

AC/DC - Inglaterra 1976

AC/DC – Inglaterra 1976

Malcolm Young: “Quando nós víamos que os punks chegavam e começavam a cuspir e chamar os outros para a briga, nós descíamos do palco pra socar esses idiotas.”

Apesar do visível desprezo com os punks, um dos princípios éticos de trabalho da banda demandava que nunca deixassem uma apresentação pela metade.

Malcolm Young: “Certa vez fizemos o show de abertura para os The Stranglers. Eles tiveram uma das apresentações de abertura cancelada, aí então demos um jeito de encaixar a nossa banda pra tocar na abertura do show deles no dia seguinte.

Estávamos dividindo o mesmo vestiário com esses caras, e eles ficavam nos provocando com ‘hippies do caralho, hippies fumantes da porra’. O Bon já estava se preparando pra partir pra cima deles, aí eu chamei ele num canto e disse: ‘Bon, deixa isso pra lá. Vamos subir no palco e mostrar pra eles quem é melhor’.

E foi isso que aconteceu. Aí voltamos ao vestiário – que agora estava cheio de drogas e drogados -, e o Bon provocou os caras: ‘E aí seus cusões! Quem são os hippies do caralho agora?!’

Então, bandas como Sex Pistols começaram a aparecer pra ver as nossas apresentações. Nós não éramos punk, mas a atitude desse estilo era fortemente vinculada ao AC/DC. Eles iam nos assistir pra ver o que estava pegando – todo mundo estava falando sobre os ‘punks do AC/DC’. E acredite, nós nunca fomos ver um só show desses caras, eles é que apareciam.”

Enquanto o AC/DC tirava proveito da cena punk, os notáveis três acordes eram – de certa forma – inspirados em bandas como The Clash, que assim como o AC/DC, também tinha como pilares musicais os trabalhos de Chuck Berry e Bo Diddley.

Angus Young: “Eles [The Clash] fazem uma abordagem mais política. Conosco a coisa é como o Malcolm diz ‘estamos mais próximos ao som de Chuck Berry. Ele canta sobre carros, mulheres, festas, e pra nós isso é o rock n’ roll.’

Eles [The Clash] querem vender aquela ideia política de anarquia, entende? E pra ser honesto, a primeira vez que ouvi a palavra anarquia, eu tive que ir procurar o significado dessa merda no dicionário Mas eu sou limitado, quero dizer, tive uma educação apenas no nível básico. Então esse tipo de coisa não é ‘cantar’ pra mim, ela não se comunica comigo.”

Assim como as excentricidades e mensagens do punk, a imagem (estilo) também era um problema para o AC/DC.

AC/DC: Primeira turnê pela Europa

AC/DC: Primeira turnê pela Europa

Malcolm Young: “O punk rock se tratava apenas de moda. Era só isso. Eles mudaram o mundo da moda, e não o da música. O estilo se resumia basicamente a isso.”

Angus Young: “A atitude desse estilo era a mesma que já vimos antes. Quando éramos jovens, fomos ver o The Who na Austrália, então vimos que a banda tinha praticamente a mesma atitude que o Steve Marriott tinha com os Small Faces.

Ele [Steve Marriott] foi o primeiro cara a subir ao palco e dizer ‘vocês todos são uns cusões!’ com um sotaque londrino. Ele foi o primeiro cara que eu vi nesse estilo, e ele perdeu o terreno para outras bandas. Mas como Malcolm disse, já vimos isso [punk] antes, e Steve Marriot fazia melhor que todos os outros caras. Ele tinha a voz e [os Small Faces] tinham a música.”

Entrevista retirada da revista Mojo – Edição 2010