Abruzos é uma pequena região no centro da Itália composta por quatro províncias. Apesar de ser conhecida entre os italianos por seus castelos e torres medievais, parques, estações de esqui e praias, o que tornou Abruzos conhecida entre os fãs de AC/DC do mundo todo foi o blog AC/DC Abruzzo, cheio de relatos, fotos e vídeos da última tour da banda. Os responsáveis pelo blog (e pelo projeto de mesmo nome) pegaram carona no trem do rock e fizeram o que todo fã sonha em fazer: rodaram o mundo atrás do AC/DC. Matteo (o presidente, 53 shows), Andrea (vice-presidente, 30 shows) e Stefano (secretárino geral, 47 shows), além do enviado especial Lorenzo “Orangus” (41 shows), cobriram boa parte dos 168 shows da Black Ice World Tour. Foram quase 2 anos seguindo a banda por 23 países. A odisséia, conforme já publicamos aqui, foi registrada em um livro de fotos lançado em outubro.

Conversamos com Matteo “Abruzzo” Ippoliti, o simpático cofundador do projeto e autor do livro, que nos contou um pouco mais sobre o AC/DC Abruzzo, o livro, a tour…

Para aqueles que não estão familiarizados com a cultura italiana (a maioria de nós, provavelmente), você poderia explicar qual é “o original e genuíno espírito da região italiana de Abruzos”?

Ciao, Brasil! Para aqueles que não sabem muita coisa sobre este lindo país chamado Itália, posso dizer que há uma enorme diferença cultural, histórica e até mesmo linguística de uma região para outra. Abruzos não é tão famosa quanto outras regiões, como Toscana ou Sicília, mas aqui nós sabemos melhor do que outros o verdadeiro significado de paixão: paixão por comida, paixão por la Dolce Vita e, claro, paixão pelo rock ‘n’ roll! O que é um abruzense? Certamente alguém gentil, hospitaleiro e amigável. Trabalhador, irônico, criativo, sarcástico e sempre muito leal, às vezes muito teimoso também. Nós aplicamos todos esses atributos à última tour do AC/DC e surgiu algo bem peculiar e único… AC/DC Abruzzo!

Qual é a sua história com o AC/DC? Quantos anos você tinha quando ouviu a banda pela primeira vez?

Nós todos temos por volta de 30 anos, então começamos um pouco tarde. Para mim foi o The Razor’s Edge, que adquiri logo após escutar o single Big Gun… para Andrea foi um pouco antes, mas nessa mesma fase. Stefano era virgem até o Stiff Upper Lip.

E quando vocês viram a banda ao vivo pela primeira vez?

Ainda me lembro de quando o AC/DC tocou em Roma durante a Ballbreaker Tour, em 1996. Eu era muito novo e meus pais não me deixaram ir. Foi bem frustrante. Andrea, que é um pouco mais velho do que eu, teve a sorte de ir. Ele nos conta até hoje a história de quando Brian mandou cerveja para os fãs que esperavam do lado de fora da arena. A cara do Brian! Eu estava estudando na Inglaterra na época da Stiff Upper Lip Tour, e meu primeiro show deles foi em Birmingham, em 2000. Depois, Milton Keynes em 2001… e então veio a epifania, no Hammersmith [lendária casa de shows de Londres] em 2003. Andrea também foi vê-los em Paris em 2000, em Turim em 2001 (quando conheceu Angus e Malcolm no backstage) e em alguns outros shows. Ele também viu a banda na Alemanha com os Stones, em 2003. O primeiro do Stefano foi o show no Hammersmith. Por ironia, todos nós estávamos no show do Hammersmith em Londres, em outubro de 2003. O último show do AC/DC em 5 anos.

Como exatamente o Projeto AC/DC Abruzzo ganhou vida?

Vou te contar a história toda… os “pais fundadores” oficiais são Stefano, Andrea e eu. Stefano é um grande amigo de infância, e dividimos a maioria das experiências que vivemos em termos de rock, assim que tivemos idade suficiente para ir a shows (bandas grandes, normalmente, só tocam em Milão, e Abruzos fica bem longe…). Ironicamente, conheci o Andrea apenas 2 anos atrás, por meio do Marco do AC/DC Italia, para quem eu tinha feito uma reportagem exclusiva sobre a gravação do vídeo de Rock ‘n’ Roll Train em Londres, em agosto daquele ano. Não pude acreditar quando soube que ele também era de Abruzos! Imagine: 3 dos fãs italianos mais loucos por AC/DC morando a poucos quilômetros de distância um dos outros! E todos estavam em Londres, em 2003, para o último show do AC/DC… Em 24 de outubro [de 2008], fomos parar em Scranton, na Pensilvânia, a poucas milhas de Wilkes Barre, onde rolaria o show secreto (Ensaio Final). A idéia surgiu naquela noite, no nosso quarto de hotel. Sentimos que o ano seguinte seria especial e que algo especial deveria ser feito… até para ficar guardado para a posteridade também. Criamos o blog, e o resto é história… Mais tarde, Orangus – outro fã maluco que conhecemos do lado de fora do Hammersmith em 2003 – entrou para a equipe como “enviado especial”. Ele não é de Abruzos, mas definitivamente compartilha dos mesmos princípios… acreditar nos poderes infinitos do Rock ‘n’ Roll e ir a quantos shows do AC/DC for possível!

E qual é o segredo do sucesso do projeto?

Talvez seja trabalho árduo combinado com sorte e organização, além de um pouco de loucura e atitude genuinamente rock ‘n’ roll. Na verdade, viajamos o mundo com pouquíssima verba, frequentemente sem ingressos e com o objetivo de ver a maior quantidade de shows possível. Então, não foi nem um pouco fácil… No fim, cobrimos 85 shows, mais da metade da tour inteira. Apesar dos altos e baixos, faríamos tudo outra vez.

A idéia do livro já existia quando o projeto começou ou surgiu durante a tour, por causa da grande quantidade de fotos e histórias legais que você queria dividir?

O Projeto AC/DC Abruzzo estava relacionado apenas ao nosso blog, que usamos para contar histórias da estrada durante a tour. Mas nós sabíamos que estávamos fazendo algo excepcional, algo que só acontece uma vez na vida. Também queríamos compartilhar parte do nosso sonho (documentado com fotos, relatos, histórias, notícias, etc.) com o resto da comunidade de fãs do AC/DC. E tentamos manter nossa postura genuína/teimosa/irônica de Abruzos, às vezes brincando com típicos estereótipos italianos, como comida e mulheres… Foi uma surpresa termos ido parar em sites grandes, como o acdc.com. Mas nós adoramos! O livro, embora pareça ser mais “profissional”, é provavelmente apenas a continuação disso tudo… mas nós sentimos que era algo que precisávamos fazer para nós mesmos e para todos os outros fãs.

Você poderia nos contar alguma dessas histórias?

Nossa! São tantas… a maioria delas está no nosso blog. E nós incluímos algumas histórias inéditas exclusivas no livro também. Claro, nossas favoritas envolvem os encontros com a banda… mas também temos algumas histórias legais com outros ícones que gravitam ao redor do AC/DC… Ross Young, filho do Malcolm, é definitivamente uma das pessoas mais legais que conhecemos. Ele leva a vida como um rockstar, mas é muito amigável e pé-no-chão… além disso, os outros fãs, como os “hardcore” que costumávamos encontrar ao redor do mundo, quase como mágica, antes ou depois dos shows (do vovô rock ‘n’ roll Alan aos mesmos fãs “hardcore” alemães de sempre, que nunca tiravam suas jaquetas do AC/DC).

Qual foi seu show favorito da Black Ice World Tour, se não for impossível escolher?

Pergunta difícil. Aqui vai a “resposta oficial”. Após tantos shows, concluímos que o show perfeito do AC/DC é uma combinação dos três elementos a seguir: local, performance da banda e público. A tour europeia indoor em 2009 foi nossa favorita. Lugares fechados pequenos (apenas 10 mil / 15 mil pessoas), com setor Geral em pé, ideal para tirar total proveito da experiência de ver o AC/DC perto do palco. Você podia pular, gritar, cumprimentar o Brian, fazer contato visual com Angus, ter uma experiência rock ‘n’ roll fantástica de forma muito mais íntima do que em shows de estádio. A maioria desses shows estava repleta de fãs “hardcore” que fizeram todo tipo loucura para conseguir ingressos (os ingressos para todos os shows daquela perna se esgotaram em poucos minutos, e cambistas os vendiam por 5 vezes o valor real). Foi provavelmente o momento mais difícil da tour para nós, principalmente a busca por ingressos no inverno gelado… mas foi o momento mais gratificante, definitivamente!

E qual foi o público mais louco?

Bem, tirando a América do Sul (Brasil e Argentina), que é simplesmente outro nível em se tratando de grandes shows de rock, eu diria, em ordem: França, Itália, Irlanda, Espanha e Escócia… mas, claro, digo isso com base nas nossas impressões, nos shows a que fomos, especialmente na perna indoor.

Sabemos que vocês tiveram a chance de se encontrar com a banda algumas vezes. Que tipo de relação pode-se dizer que vocês têm com eles?

Bem, eu não chamaria de “relação”, afinal, nós nos encontramos apenas algumas vezes… mas foram vezes suficientes para que eles se lembrem de nós (e da nossa bandeira da Itália/Abruzos!)… eles são todos muito gentis com fãs, além de pessoas muito humildes. Às vezes, nos surpreendemos ao ver o quanto eles se importam com os fãs. Vimos o Angus e o Malcolm saírem do hotel diversas vezes só para cumprimentar fãs e assinar autógrafos. Uma vez, após um show em Budapeste, Angus até saiu debaixo de chuva para falar conosco e com outros fãs “hardcore” na porta do hotel! Incrível!

Na sua opinião, quem é o mais aberto para os fãs (se eu tivesse que adivinhar, diria que é o Brian)? E quem é o mais reservado (aposto no Phil)?

Você está definitivamente certa! Bom palpite! Fora do palco, o Brian é um cara normal, diferente daqueles ícones rockstars /celebridades que você vê em revistas ou na TV… se você tiver sorte, pode, um dia, se pegar em um pub tomando cerveja com ele e ouvindo suas histórias, de sua infância em Newcastle à última corrida de carros da qual participou, em algum lugar dos Estados Unidos. Ele é muito engraçado e irônico e fala um pouco de italiano também (ele é meio italiano!). Exímio conhecedor de comida e vinho. Às vezes, pela sua postura, suspeitamos de que ele tenha algum ancestral abruzense… hahahah. Cliff está frequentemente com Brian e também é bem legal, pé-no-chão e divertido. Especialmente quando conta histórias “da vida real” dele e do Brian (eles moram na mesma cidade). Ele tem ótimas histórias das antigas também, principalmente sobre mulheres… Malcolm e Angus são mais fechados, mas muito simpáticos. Eles não falam muito, mas quando o fazem, você não se esquece do que eles disseram! Carisma rock ‘n’ roll sem igual! E sim, o Phil é definitivamente reservado, mas ele é um roqueiro tão old school, mesmo com seu comportamento “não muito diplomático”. Nós o amamos!

Agora que a “maratona” acabou, como é voltar à rotina? Existe vida após a Black Ice World Tour?

Vai ser difícil! Não sei quanto aos outros caras, mas será difícil ficar em um só lugar. Pessoalmente, sou viciado em viajar, então continuarei viajando a trabalho. O bom da tour foi que conseguimos criar um “estilo de vida móvel” que ainda pode funcionar bem, mesmo profissionalmente. Então, por ora, adeus Abruzos… Andrea, por outro lado, é o único membro da equipe casado e com emprego estável, como funcionário. É provável que ele trabalhe em algum outro projeto com sua esposa…

Muito obrigada pela entrevista, Matteo. Grazie! Algo mais que você gostaria de dizer?

Obrigado, Luiza! Foi um enorme prazer. Ciao e grazie a todos os leitores do AC/DC Brasil. Keep on rocking!