O baixista Cliff Williams deu uma entrevista exclusiva para a revista Bass Player no ano passado. O músico falou um pouco sobre os equipamentos que usa na estrada e nas gravações, contou sobre alguns detalhes exclusivos do processo de gravação do álbum “Rock or Bust“, sobre a ausência de Malcolm Young e muito mais.

Confira!

Qual é a diferença entre tocar com Chris Slade e Phil Rudd?

Eles são dois diferentes bateristas, isso é lógico. Chris tem um estilo de tocar bateria um pouco diferente. Phil é um pouco mais solto, mas Chris faz um trabalho excelente. Ele não afeta o meu estilo de tocar; simplesmente faço o que sempre faço e encaixa legal com Chris.

Qual foi o impacto da ausência de Malcolm durante os processos de composição e gravação?

Angus estava com todo o material pronto para entrarmos em estúdio. Muitas das ideias que ele reuniu vieram de riffs que ele e Malcolm criaram. Os dois têm toneladas de fitas com ideias que ainda não foram trabalhadas. Tudo estava muito bem organizado quando entramos em estúdio. E Stevie já vinha trabalhando junto com Angus antes de tocarmos como uma banda, então isso acelerou o processo. Quanto à personalidade, Stevie é muito parecido com Malcolm, e isso reflete também em seu jeito de tocar – ele toca igual ao Malcolm. Olhando por essa perspectiva, não há grandes diferenças. Tudo funcionou muito bem assim como funcionava com Malcolm.

Stevie já havia tocado com você antes…

A formação atual é bastante similar com a dos anos 80; Malcolm e Phil estavam ausentes. Stevie estava dentro e naquela época tínhamos um baterista chamado Simon Wright. Então, de certa forma, já tivemos esse tipo de cenário antes.

Você tem acesso ao material para trabalhar antes de entrar em estúdio?

Não. Nós simplesmente nos reunimos [no estúdio]. Essa é a nossa segunda vez com Brendan O’ Brien e foi no mesmo estúdio em Vancouver onde gravamos o álbum Black Ice. Nós gostamos de trabalhar com Brendan. Ele é um músico acima de tudo. Ele possui excelentes ouvidos e sabe como fazer um arranjo legal para as músicas. Nós temos muita consideração por ele. E com todo respeito aos produtores, Brendan não é só um cara que comanda a equipe para ficar apertando botões. Ele bota a mão na massa – e isso faz uma grande diferença pra nós. Nós íamos ao estúdio todos os dias da semana, e ele nos acompanhava e cuidava pra manter todo mundo envolvido. Consequentemente as faixas principais do álbum foram feitas em um mês. Isso é fantástico, pois o material saiu fresco. No passado tivemos alguns situações onde fomos gravar e levou meses e meses pra sair, e de certa forma isso acabou nos complicando. Dessa vez foi como gostamos: gravar material fresco. Estamos orgulhosos.

AC/DC. 2015. Foto promocional.

AC/DC. 2015. Foto promocional.

Sua forma de tocar é fantástica. “Got Some Rock & Roll Thunder”, em particular, tem quase uma vibe parecida com a de Andy Fraser.

Eu não levo muito crédito por isso. “Ang”[Angus] tocou a demo para essa música e também tocou todo o baixo. Brendan pegou a música e linha do baixo que Angus havia tocado e a dividiu várias partes. Aí então só coloquei meu estilo e toquei da melhor forma que consegui.

Você parece ter uma habilidade inata para sintetizar o riff da guitarra, mas sem tocá-lo de forma igual, assim deixando mais espaço.

Simplesmente acontece; eu só faço o que acho certo. Isso é algo que foi aprimorado ao longo dos vários anos tocando com esses caras – eu só escuto e toco junto com eles, de verdade.

Você usa cordas flatwound no estúdio. E ao vivo?

Por décadas eu tenho usado flatwound em todos os lugares – estúdio e ao vivo. Eu prefiro o “punch” e peso de uma corda flatwound. Cheguei a tocar cordas wires quando era mais novo, mas elas fazem muito ruído.

Você continua tocando com baixos StingRay?

Sim. Eles são verdadeiros e bons “cavalos de carga”, eu os amo. Os que eu uso são todos dos anos 70. Eles são excelentes. Engraçado ou não, eu tenho 5 deles comigo enquanto estamos em turnê, dos quais eu não preciso [risos]. Todos eles são de 2 cores e soam quase que iguais, o que é maravilhoso.

Você já tentou um baixo diferente com o AC/DC?

Eu cheguei a tocar um Fender Precision por um tempo quando eu entrei para a banda. Depois eu toquei um Steinbeger. Esses foram os primeiros com captadores ativos que eu usei, e acabei gostando do som, mas detestei o baixo. Toquei com eles na estrada por um tempo, mas eu não gostava do formato, foi aí então que eu tomei coragem e os deixei de lado pra tentar um P-Bass [Precision Bass, primeiro modelo de baixo elétrico da Fender], o qual não é ruim. Também toquei um pouquinho com um Fender Jazz e também com um Gibson Thunderbird, mas não foi por muito tempo. Eu sempre volto aos baixos Music Man.

Eu já vi você tocar com os dedos algumas vezes, mas você é conhecido por contar com palhetas.

Hoje em dia eu raramente uso os dedos. De novo, com as cordas flatwounds, o uso de palheta dá um ótimo punch sólido.

Downstrokes [golpear pra baixo as cordas] ou alternado [mix downstrokes e upstrokes – golpear pra cima]?

Downstrokes até que as mãos parecerem que vão cair [risos].

Como foi o seu primeiro contato com a música?

Cliff Williams. AC/DC. Promo Álbum "Rock or Bust".

Cliff Williams. AC/DC. Promo Álbum “Rock or Bust”.

Foi por causa do trabalho do meu pai, nossa família vivia se mudando. Eu nasci em Londres, mas nos mudamos para Liverpool porque a empresa em que ele trabalhava o transferiu. Eu tinha 11 anos de idade nessa época, e estava por lá rolava muito o “Mersey Sound”. Isso foi em 1961. Os Beatles e os Stones tinham acabado de aparecer, e todo mundo na escola queria ter uma banda, principalmente em Liverpool, e eu também estava nessa onda. Então, eu entrei para uma bandinha escolar, ali comecei a tocar guitarra por um tempo. Aí quando apareceu uma vaga para baixista, eu fui para o baixo. É foi o que fiz até então.

Quais foram as suas influências?

Paul McCartney e Pete Quaife dos Kinks. Eu também escutava muito material de Stax e Tamla/Motown – não que eu conseguisse tocar aquilo. Eu sempre procurei tocar rock n’ roll e seguia os estilos das bandas dos anos 60 que eram conhecidas naquela época.

Muitos de nossos leitores não sabem que você teve uma carreira nas bandas Home e Bandit antes de entrar para o AC/DC.

Eu e Laurie Wisefield entramos para a Home em 1967, em Londres. Eu deixei a escola e fui direto pra Londres tentar viver de música full time. Mais tarde, Laurie foi tocar na Wishbone Ash, e ele tinha tocado guitarra como músico contratado para quase todas as almas existentes do mundo da música da época. Isso durou até o começo dos anos 70. Com a Bandit a paixão durou pouco. Eu cheguei a gravar um só álbum com aquele grupo.

Fiquei bastante intrigado com você tocando na música “Dreamer” da Home. E tão diferente do que estamos acostumados ouvindo no AC/DC.

Pareceu ser o jeito certo de se tocar para essa música. Normalmente é só uma questão de pegar o que você julga como a melhor parte da música e tocá-la da melhor forma que puder – simplesmente isso, de verdade.

Como você conseguiu a vaga para o AC/DC?

Um amigo guitarrista me ligou. Meu nome havia sido encaminhado, e eu fui convidado para o teste, o qual eu fiz. Simples assim.

Você já os conhecia?

Sim. Eu os vi no programa Top of the Pops na TV, e eu ouvia falar sobre eles. Falavam muito bem deles em Londres naquela época.

O que você tocou?

A primeira música que nós tocamos foi “Live Wire”, a qual, de fato, nós usamos para abrir os shows naquela época. Então eles me deram alguns álbuns pra aprender após o primeiro teste.

Eles te deram algumas instruções ou foi tipo, “toque como quiser”?

Não, eu toquei do meu jeito. Tinha um carinha que eles gostaram também… Colin Pattenden, que era baixista da Manfred Mann. No final, eu fui o sortudo que eles escolheram.

O primeiro álbum que você gravou com o AC/DC foi “Powerage”, mas o baixista Mark Evans fala que ele tocou alguma coisa nesse disco. Há quem diga que George Young também tocou.

Na verdade não, e naquelas alturas, Mark já estava fora da banda. A Embaixada Australiana em Londres estava me complicando… eu havia feito uma entrevista e fui liberado, só que logo depois disseram que não. Isso aconteceu umas 4 ou 5 vezes, e os rapazes já estavam em estúdio na Austrália. Eu falei para o cara da Embaixada: “Olha, eu vou perder esse emprego”, e ele respondeu: “Bom, então talvez algum australiano vá ganhar uma oportunidade”. Eles queriam ser filhos da puta. Assim que eu finalmente consegui o visto, deu tudo certo e nós gravamos o álbum.

Além de Brendan O’Brien, você já trabalhou com outros produtores, incluindo Mutt Lange e Rick Rubin. O que eles acrescentaram para uma banda que já tem um som estabelecido?

Os rapazes fizeram sucesso com os primeiros álbuns na Europa e Austrália, mas a banda não tinha conseguido pisar nos EUA. O primeiro álbum que fizemos com Mutt foi Highway to Hell, e ele estava no começo de carreira naquela época. Ele é um desses caras com um fantástico par de ouvidos e com rico histórico musical. Ele havia sido baixista e cantor na África do Sul antes de ir para a produção. Nós gravamos outros dois discos com Mutt: Back in Black e For Those About to Rock. Naquela época ele estava trabalhando com muitas outras bandas, como Def Leppard, e ele estava começando a criar uma assinatura no som. E eu acho que este foi um dos motivos de Angus e Malcolm decidirem trocar de produtor. Eles acharam que essa assinatura de som do Mutt estava começando a ser mais predominante do que o som da banda. Foi assim. Mas nós fizemos um tremendo sucesso com ele.

Falando de sucesso, o estilo de vida rock n’ roll nunca fica velho?

É o tocar que nunca envelhece. Viajar e a vida em hotéis envelhece, mas é o tocar que nos motiva a continuar.

Você tem algum conselho para os nossos leitores?

Escute aqueles com quem você está tocando – escute todos eles. Não é raro ver a garotada “destruindo” sozinhos. Seja parte de uma unidade e escute os outros músicos e o que está rolando ao redor de você. E persistência é uma coisa maravilhosa.

Fonte: Bass Player